segunda-feira, 4 de junho de 2007

Linéu e a Árvore da Vida

"Na Suécia, a Primavera chega tarde. Por isso, ainda se registava um clima primaveril a 23 de Maio de 1707, dia em que a mulher do cura de uma pequena aldeia sueca chamada Stenbrohult deu à luz um filho. Além de pastor luterano, o pai da criança, Nils Lineu, era um botânico amador e um jardineiro apaixonado que inventara o seu apelido (requisito burocrático para se inscrever na universidade) a partir da palavra sueca lind (que significa tília), substituindo assim o patronímico tradicional: filho de Ingemar. Nils Lineu adorava plantas.

Nils Lineu adorava plantas. Christina, a mãe da criança, era filha de um vigário e tinha apenas 18 anos. Deram ao rapaz o nome de baptismo Carl e, segundo reza a história, filtrada por retrospecções míticas sobre o homem que se tornou o botânico mais proeminente do mundo, decoraram o berço com flores. Quando era pequeno e fazia birras, punham-lhe uma flor na mão e isso acalmava-o – uma vez mais, segundo relatos posteriores.
As flores foram o seu ponto de partida para apreciar a beleza e a diversidade na natureza. Segundo parece, desde a mais tenra idade que ele percebeu que havia nelas algo mais do que beleza e diversidade. Deveria igualmente existir nelas, codificado, algum significado oculto. Rapidamente se tornou um rapaz fascinado quer pelas flores e pelas plantas que as geram quer pelos nomes dessas plantas. Aborrecia o pai, pedindo-lhe que identificasse as flores silvestres autóctones que colhia. “Mas era ainda uma criança e esquecia-os frequentemente”, segundo um relato. Um dia, perdendo a paciência, o pai ralhou com o pequeno Carl, “dizendo-lhe que não lhe diria mais nomes se ele continuasse a esquecê-los. Depois disso, o rapaz dedicou toda a sua mente a memorizá-los, para não ser privado do seu maior prazer”. Um pormenor destes parece demasiado perfeito e prodigioso para encaixar-se numa história real, contrariamente ao que sucede no drama cinematográfico ou na hagiografia. No entanto, talvez fosse verdadeiro. Os nomes e a forma como eles foram armazenados na memória, juntamente com os conjuntos de informação a que se referiam, são temas permanentes da maturidade científica de Lineu. Mas para entender a enorme fama por ele granjeada e o seu legado, precisamos de reconhecer que Lineu não era apenas um excelente botânico e um prolífico criador e memorizador de nomes. Tinha um carácter mais moderno: era um arquitecto da informação. Se consultar um resumo biográfico de Carl Lineu numa enciclopédia ou numa página de Internet, irá provavelmente ler que elefoi o “pai da taxonomia”, ou seja, da classificação biológica. Lerá que ele criou o sistema binominal latino de nomenclatura das espécies, ainda hoje utilizado.
Estas afirmações estão relativamente certas, mas não explicam o que tornou este homem tão importante para a biologia durante a sua época e para os séculos posteriores. Poderá ler que ele criou o nome Homo sapiens para a nossa própria espécie e que, numa atitude ousada, nos inseriu numa categoria de mamíferos que incluía macacos e símios. Também é verdade, mas é uma conclusão um pouco enganadora. Lineu não era um evolucionista convicto. Pelo contrário, ele acarinhava a perspectiva criacionista das origens biológicas, segundo a qual o estudo da natureza revela provas dos poderes criadores e da misteriosa ordem divina. No entanto, não era devoto ao ponto de apenas procurar a presença de Deus no mundo material.
Eis o que o torna um herói do nosso tempo: valorizava a diversidade da natureza por si e não apenas pela sua edificação teológica, e ansiava abarcar todos os componentes possíveis no interior da sua mente. Lineu acreditava que a humanidade deveria descobrir, denominar, contar, compreender e apreciar todo o tipo de criaturas existentes na Terra."
Texto de David Quammen; Fotografia de Helene Schmitz

1 comentário:

natura.viva disse...

O site da fotógrafa Helene Schmitz: http://www.heleneschmitz.se/
Digno de se ver.